Deixo aqui um artigo no nosso conterrâneo Miguel Monjardino,de 28 de Janeiro de 2008 no jornal ExpressoSe olharmos para as duas últimas décadas vemos que este domínio tem sido total desde 1990. De então para cá, uma série de importantes inovações ao nível da precisão e do comando e controlo permitiram à USAF, ao Exército e Fuzileiros norte-americanos transformar profundamente a concepção e execução das operações aéreas e terrestres. A actual supremacia militar dos EUA depende em parte deste novo poder aeroespacial. Este poder, é verdade, não garante a vitória política. Garante, todavia, que Washington tem à sua disposição um instrumento estratégico com que a maior parte dos decisores políticos nas outras capitais apenas pode sonhar.
Portugal nunca foi indiferente para a USAF. A Base das Lajes nos Açores explica porquê. Durante a Guerra Fria, a base foi importante para a defesa avançada dos EUA, controlo aeronaval no Atlântico, missões nucleares do Strategic Air Command e apoio à projecção do poder militar americano na Europa Ocidental e Médio Oriente. Nos últimos anos, a base acolheu a Cimeira do Atlântico entre George W. Bush, Tony Blair, José María Aznar e José Manuel Durão Barroso e tem apoiado a mobilidade estratégica dos EUA em direcção ao Iraque e Afeganistão.
Para um país com dificuldade em transformar a maneira como se relaciona com os EUA, as Lajes continuam a ser o trunfo geoestratégico que tem permitido a Lisboa lutar acima do seu peso em Washington. Será que esta situação se vai manter nos próximos 15, 20 anos? A resposta, como é costume, nestas coisas não depende exclusivamente de Lisboa. Depende do interesse da USAF. Uma série de acontecimentos recentes mostram que Lisboa e Washington estão profundamente envolvidas numa discreta negociação que poderá vir a alterar substancialmente a missão que as Lajes têm desempenhado nas últimas décadas.
No coração desta negociação está a ideia de transformar as Lajes numa base de treino para os aviões e novas plataformas da USAF estacionados na Europa e nos EUA. Os aliados da NATO também podem vir a participar nestes treinos. Em Novembro passado, pouco antes de passar à reserva, o general William Hobbins, comandante da Força Aérea americana na Europa, argumentou que as Lajes eram um excelente local para treinos do F-35 Lightning e de outros sistemas de armamento como mísseis hipersónicos. O F-35 ainda está em desenvolvimento mas, juntamente com o novo F-22 Raptor, promete garantir à USAF e aos seus aliados o domínio aeroespacial nas próximas décadas.
O problema com os chamados 'caças de quinta geração' tem a ver com sua velocidade e sistemas de armamento. O treino a velocidades supersónicas e o uso de armamento muito sofisticado exige espaços enormes e pouco habitados. Hoje em dia é muito difícil arranjar espaços com estas características na Europa. No que toca aos EUA, a base aérea de Nellis no Nevada, tem sido até agora uma boa opção para o treino de pilotos e caças. Mesmo assim, o treino dos F-22 e F-35 terá alguns constrangimentos em Nellis. Do ponto de vista da USAF, as Lajes são uma hipótese muito interessante. A capacidade logística e de estacionamento da base é enorme. A temperatura do Atlântico e as capacidades dos novos helicópteros da Força Aérea Portuguesa garantem missões de busca e salvamento durante quase todo o ano. Havendo interesse por parte de Lisboa, o espaço disponível para treinos é enorme. Tudo parece indicar que as Lajes vão continuar associadas ao poder aeroespacial dos EUA.
O último discurso
George W. Bush fará o seu último discurso sobre o estado da União na próxima segunda-feira. É pouco provável que o primeiro parágrafo do seu discurso seja parecido com o célebre parágrafo do seu antecessor Harry Truman em 1949: "Estou contente por relatar a este 81º Congresso que o estado da União é bom. A nossa Nação está mais habilitada do que nunca para ir ao encontro das necessidades do povo americano e para lhe dar uma oportunidade decente na busca da felicidade. Esta grande República é a primeira entre as nações na busca pela paz". As sondagens internacionais mostram que não é fácil associar George W. Bush a estas palavras. Parte do problema tem a ver com as opções políticas da primeira administração W. Bush. A outra parte está relacionada com o preço a pagar pelo poder e liderança. Da Pérsia à Inglaterra, passando por Atenas, Esparta e Roma, a história não regista muitas potências hegemónicas populares.
Dizem-me que o mundo espera ansiosamente pelo fim da administração W. Bush. Dizem-me também que o mundo quer a América de volta. Dizem-me que com um presidente democrata o mundo ficará mais seguro. O problema aqui é que a maior parte das pessoas tem uma opinião exagerada sobre o poder e influência do presidente dos EUA. O Senado, a Câmara dos Representantes, o Supremo Tribunal e a poderosa burocracia governamental não existem nos nossos debates sobre Washington. Por esclarecer, fica também saber quem é a melhor pessoa para liderar os EUA a partir de Janeiro de 2009. Digamos que o mundo está bastante dividido neste capítulo. Nos gabinetes ministeriais europeus toda a gente reza silenciosamente uma nova oração política - a oração pelo regresso dos Clinton à Casa Branca. África e uma parte substancial do mundo muçulmano ficaria extremamente contente com a eleição de Barack Hussein Obama. Nova Deli e Pequim nunca se deram bem com presidentes democratas e preferem claramente alguém com a história e a experiência de John McCain. O final anunciado da administração W. Bush esconde grandes divergências e expectativas políticas.

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